quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A Vida na Selva de Pedra

                Eis que, numa bela manhã de setembro, eu descobri que era um urso. Veja bem: eu não havia me tornado um urso; eu sempre fui um urso, apenas não havia percebido. Na verdade, ninguém parecia ter notado que eu tinha 2,5m e pelos por todo o corpo. Exceto pelas atendentes de lojas de roupas. Elas sempre me contavam como era difícil achar calças no meu tamanho no estoque.
                Entrei em desespero. Imagine só, acordar e perceber pertencer à uma espécia diferente! Resolvi me acalmar. Respirei fundo. “Poderia ser pior.”, pensei. “Eu poderia ser um peixe. Ou uma esponja.”. É, eu odiaria ser uma esponja. Ao menos eu ainda estava no filo certo. Isso aí. Cabeça erguida! Me vesti (feliz em não precisar mais ter vergonha da minha dificuldade em abotoar a camisa, afinal, não é algo exatamente fácil de ser feito com patas daquele tamanho), tomei meu café da manhã rico em carboidratos (um cara grande como eu precisa de muitos carboidratos pra ter energia pro dia) e fui trabalhar. Todos continuavam alheios ao fato de eu ser um urso. “Viu? Ninguém nem percebeu. Nada vai mudar.”, pensei.
                Apesar disso, eu continuava incomodado com minha descoberta. Liguei para o meu terapeuta e perguntei se ele tinha um horário livre. Oito e meia. Ok. Saí do trabalho e fui pra minha consulta (agora fazia muito mais sentido o fato de eu não caber direito em nenhum carro).
                “Doutor, hoje eu descobri que sou um urso.”.
                “Perdão?”.
                “Um urso, doutor. Eu sou um urso.”.
                “Por que você acha isso?”.
                “Pra começar, eu tenho um focinho.”.
                “Olha, seu nariz pode não ser pequeno, mas não chega a ser um focinho.”.
                “Ele é preto e gelado. É um focinho. E veja meus dentes!”.
                “Já tive pacientes com dentes piores. Nada que alguns anos de aparelho não resolvam.”.
                Foi então que percebi que havia algo de errado com meu terapeuta. Algo em sua aparência não estava certo, mas eu não conseguia dizer o que. Com um certo esforço, consegui perceber: o Dr. Monteiro era um salmão. Seus olhos se arregalaram por trás dos enormes óculos quando ele viu que eu avançava em sua direção salivando como... bem, como um urso perante um salmão. Eu não vou mentir pra vocês: o Dr. Monteiro era delicioso.
                Voltei pra casa, caguei no quintal do vizinho e fui dormir. Como era bom ser um urso.

Nenhum comentário:

Postar um comentário