segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Ilustre desconhecido

             Ricardo tinha essa “maldição” há anos. Começou sem motivo aparente, no escritório. Um colega olhou para Ricardo e comentou com outro “nossa, cara, ele não parece o...”. Jamais terminou a frase. Ninguém nunca conseguia lembrar com quem Ricardo parecia, mas todos concordavam que ele parecia muito. Parecia que o infortúnio do pobre homem jamais acabaria. Ele havia quase se conformado com o fato de que seria abordado em todos os lugares que fosse pelo resto da vida. Até que reconheceram-no. Dois policiais. “Ei, ele não parece o...”. Levaram-no preso. Acontece que ele se parecia muito com o retrato falado divulgado na TV do culpado por uma série de assassinatos.
            Mas ao menos nunca mais teve de ouvir a maldita pergunta.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Um breve encontro

           Exatamente 42 minutos depois de eu ter feito meu pedido, meu hambúrguer chegou. Eu quase chorei de emoção. Um hambúrguer de picanha com queijo cheddar, maionese, alface americana, tomate, cebola, picles e onion rings acompanhado de batatas fritas com pimenta-do-reino. Era como se deus tivesse descido à terra em forma de hambúrguer. Primeiro, eu senti o cheiro do hambúrguer. Deixei que minhas narinas banqueteassem na exuberância de aromas daquele prato. Depois, peguei-o com firmeza e dei uma leve apertada, sentindo a maciez do pão que aconchegava todo o resto. Preparei-me para dar uma mordida e... ele falou comigo. O hambúrguer olhou nos meus olhos (não me pergunte o porquê, já que ele não tinha nada que lembrasse mesmo que remotamente um olho, mas eu conseguia sentir um olhar haburguesco penetrando minha alma) e disse-me:
            -"A moral do povo discrimina entre a força e as expressões da força, como se por trás do forte houvesse um substrato indiferente que fosse livre para expres
            E então eu o comi. Ah, quanta coisa eu poderia ter aprendido com aquele sanduíche niilista se ele não fosse tão, tão delicioso...